Esse era um daqueles
voos que parece que, ao contrario do esperado, fazem as distancias aumentarem.
Não adiantou comprar o último livro da sua escritora favorita, nem a busca
intensa por resgatar algum filme descente da lista sempre desatualizada que a aerolinha
oferecia. Parecia simplesmente que o voo e todo o que o envolvia estava
inventado para gerar um tedio imenso.
As companhias ao
redor eram vizinhos estranhos à sua aparente realidade individual e única.
Todas e todos pareciam de fato estar curtindo. O menino sentado na janela
parecia hipnotizado jogando numa tablete. O menino tinha ganhado o privilegio
de ficar nesse lugar que inicialmente era o dela, só pela sua pequena idade (com
certeza não pela sua simpatia inexistente). O pai, que ia sentado no meio dos
dois, confundia os verbos de cochilar e
ler o jornal e os fundia numa
harmonia surpreendente. Na sua direita, depois do corredor, uma senhora de
idade dormia tranquilamente a pesar dos roncos agudos e frequentes. Na verdade
nenhuma dessas presenças absortas a incomodava, só gerava uma inveja
dissimulável mas patente...por que também para ela não poderia ser um simples e
agradável voo?.
Continuando com
sua tentativa de fugir ao tedio voltou por quarta vez ao banheiro, só como
escusa para esticar os pês e matar um pouco mais de tempo. Rapidamente resolveu
o que tinha que ser resolvido nesse espaço minúsculo, mas quando se dispunha a
sair do banheiro a tranca não cedeu. Ela tentou a segunda vez e nada, a
terceira já perdeu um pouco a paciência, na oitava começou a ter medo e na
decima simplesmente ficou com a tranca na mão. Nesse momento duvidou do que
fazer já que constituía uma vergonha possivelmente desnecessária pedir ajuda,
mas depois de mais tentativas inúteis teve que se render e inicialmente falar
alto até finalmente gritar já que ninguém parecia escutar. As aeromoças falavam
atrás da porta tentando tranquiliza-la e ouvia como uma e outra pessoa forjavam
a porta, mas nada. Depois de meia hora de tentativas sem sucesso, uma aeromoça
com uma voz muito calma pediu a ela paciência e desculpas já que no voo não
havia ferramentas para poder solucionar o impasse, mas que assim que pousar
chegaria uma equipe capacitada para libera-la. Ela demorou um tempo para
responder, já que não acreditava o que estava acontecendo e nem que o voo
poderia ficar ainda pior. Concordou com a aeromoça segurando as lágrimas de
raiva que sentia com ela, com tudo e com todos. Sentou-se no vaso, rendida à
sua realidade, e levando a mão no cabelo sentiu a caneta que tinha pego para
segura-lo. Tinha um tempo que não sentia uma gratidão tão grande. Tirou a tampa
da caneta, sorriu, e começou a escrever com boa caligrafia e ortografia na
parede do banheiro: “Esse era um daqueles voos que parece que, ao contrario do
esperado, fazem as distancias aumentarem...”.
No hay comentarios:
Publicar un comentario